segunda-feira, 6 de junho de 2011

1- Fronteira paradigmática

Uma extensa e infindável discussão rola nos meios mais eloquentes sobre quem nasceu primeiro: a ética ou o capitalismo. Ou melhor dizendo: a moral ou o capitalismo... coitada da ética, tão imparcial e eu insinuando que ela é anticapitalista. Ela não, mas entre a moral e o capitalismo há uma certa distancia, a mesma que há entre óleo e água. Aliás o exemplo induz a outras sinestesias: o óleo lubrifica as engrenagens, estimula a concorrência e o desenvolvimento. A velocidade, a força e o objeto. Já a água, mero solvente universal de quase toda matéria organica e também telúrica...

Sobre o liberalismo, o laissez faire, laissez passer, e o panis et circensis (ironicamente apropriado por Gil e Caetano depois, seriam eles mesmos convertidos em circus...) o que senti foi o troco natural ou naturalisticamente dado ao povo. Quem pode com o povo?

Depois de tanta repressão, de tanto Cálice, a velha força doutrinária, os velhos resistentes contra a liberdade absoluta (mesmo porque hoje em dia a minha liberdade não termina onde começa a sua...) cansaram suas pernas e braços. Cansaram de ser paternalistas e dominadores. Ou o cansaço foi aplicado à força neles, que não saiam de cima do ovo.

Ingenuidades deixadas de lado, nem um nem outro grupo deixaram de ser corriqueiramente, marionetes de algo maior. Todas as forças sociais que conspiram pela dominação do povo encontram fundamento em sua própria natureza indolente, dependente, cheia de vícios de caráter. Cada povo tem o governo que merece...
No Brasil de hoje já dá pra falar que... cada povo tem a elite cultural que merece...

É nítido que ao longo da história todos os povos (com raras exceções mas não me pergunte qual) suplicaram por uma ou outra forma de dominação, de subordinação corporal e espiritual. Veja o caso dos hebreus rebeldes: na falta de um Deus palpável, forjaram um bezerro de ouro para adorar, ou seja, para sentirem-se dominados por algo acima deles. Parece próprio da natureza humana esse jugo voluntário... o que também explica a força da igreja católica baseada no velho testamento e na ira divina.

Antes, um povo mundialmente deslumbrado com a imponência da natureza dominante, hoje acredita através dos sacerdotes da ciência que o homem tudo pode, e que a moral foi ceifada pelo experimento e pela estatística, pela lógica.

Clichês consagrados: naturalismo, darwinismo, física newtoniana, causa e efeito, experimento controlado, prova científica, laboratório... uma parafernália própria de um paradigma que felizmente, hoje já mostra sua artrite em público. Mas, a coisa não se resume a um problema de investigação do universo...

O liberalismo, resultado de uma conjuntura de intentos e resultados alheios e antimetafísicos, parece muitas vezes ter brotado como sombra ou como vaso onde uma planta chamada capitalismo se fortaleceu em simbiose pura. Um meme poderosíssimo...

Não se sabe até então, se foi o capitalismo que criou o liberalismo, se foi a ciência, se foi coincidência.... a sincronia do mundo não pode ser explicada por teorias filosóficas, estou falando aqui de impressões apenas.
O pior: impressões sobre notas de uma história que nem sei se é verdadeira...

O naturalismo do darwinismo e do capitalismo avançam em passos largos, numa situação interessante, como a dos países baixos: sua margem é criada à força, e o mar do desconhecido recua. Os diques das teorias econômicas vão garantindo suas bordas, e nesse lugar que tem tanto lastro quanto dinheiro de especulação, um universo inteiro contemporaneo se cria. E a cultura, na raiz do seio familiar é tomada de tal maneira que parece insanidade pensar diferente ou lutar contra.

domingo, 5 de junho de 2011

2 - Os ecos de uma geração: introdução á crítica contra o Liberalismo Emo

É justo com o leitor eu me apresentar, uma vez que este blog representa opiniões "pessoais minhas", alguns achismos e outras impressões geradas por um estilo de vida exclusivamente meu, com a minha história, minhas conquistas, traumas e todos os itens que todos temos.

Posso afirmar que sou de uma geração intermediária, se é que isso faz algum sentido. Nasci nos anos 70, mais precisamente em 1976, mas longe de toda a balbúrdia ideológica nacionalista, americanizada, européia, cult e contracult...
Sou daquela geração que recebeu uma educação considerada boa (mas não excelente...), e afirmo de boca cheia, numa escola estadual que seria e ainda é, uma das melhores do Brasil, em São Paulo, Zona Sul (Ennio Voss). É importante contextualizar o leitor, já que todo o resto deriva disso...

Importante anotar que nesta escola, num bairro de classe média - o Brooklin, havia uma favela de picadinhos sobre um córrego imundo em frente, exatamente do outro lado da rua. O que não impedia que muitos alunos abastados ali estudassem. Aliás essa não era a única, haviam outras, e havia também as ilhas pouco mais abastadas nas redondezas. Assim, a tipologia de muitos alunos era a da mistura, de classes e grupos ideológicos. Aliás, isso era style na época... se dar bem com todos os grupos. Mas isso não é liberalismo, nem hipocrisia, é apenas brasileirismo.

Intermediário sem ser mediano, ou descambar para o medíocre (que vem de médio pra quem não sabe...). De etnia mesclada de japones, africano, europeu e índio, posso fazer piada de quem eu quiser, desde que haja bom humor nas proximidades... estudado em escola pública, no primário (municipal... tinha merenda completa!), no ginásio estadual (e já peguei ônibus pra ir pra escola depois localizada na estação Conceição...), e depois cursinho na Poli e depois na Unesp: cursinhos como "bolsa de pobreza", com desconto depois do desempenho nos simulados... e depois na estadual novamente: Unesp, Arquitetura e Urbanismo.

Profissional mediano.... não sou dos piores e não cheguei no topo (tomara que sim um dia!), e se não der certo, não vai ser por falta de vontade.

Dessa geração que eu cresci, cercado de militantes de esquerda na própria família e um autoritarismo típico japonês, displicentemente espartano e jogado no mundo pra aprender, assisti de camarote todo um burburinho e manifesto pela ordem estabelecida, e contra ela. Contra a TV, a favor, contra o americanismo, a favor, e assim por diante. Religião então... deixa pra lá...

Na minha família, até então, nenhum revolucionário. Nenhum militar. Nenhum underground, hippie, nerd ou vagabundo. A coisa caminhou navalhando tudo isso... pagando o preço de muitos clichês, claro. Mas nada muito comprometedor.

Um resumo seria o seguinte: a minha infancia e adolescencia durou até os 18 anos. Depois tive que virar adulto na marra. Mas eu sei que antes de mim a fase adulta costumava vir antes, e depois de mim, a adolescência desejaria permanecer eternamente... para os filhos de pais intoxicados por um liberalismo mal ingerido...

sábado, 4 de junho de 2011

3-O ícone Chico Buarque antes do troco da Ditadura

"Apesar de você amanhã há de ser
outro dia"
Frase bem conhecida da música de Chico Buarque, amargando contra a maldita Ditadura a promessa de vingança, a virada de mesa contra a repressão da liberdade física e intelectual, contra a opressão burra e desgraçada derivada das opiniões quadradas ao extremo dos milicos daquele tempo (e talvez de hoje também...)

Toda uma geração de artistas e intelectuais lutando contra um inimigo palpável, uniformizado, nítido em sua posição ideológica. A luta leva à ideologia necessariamente contrária, mesmo ao custo do bom senso: toda ideologia tem sentimento suficiente para não conseguir passar incólume ao vício da parcialidade radical, dogmática e de visão aguda.

A promessa é clara, e o pacto com o povo também: nós vamos transformar isso aqui numa festa e quero ver vocês milicos conseguirem nos segurar! Nós vamos acabar com a reputação de vocês, com suaas armas, corroendo de dentro pra fora, até que vocês sangrem na consciência todas as atrocidades que cometeram e cometam suicídio anunciado aos quatro cantos...

Eis aí algumas palavras que se tornaram absolutamente malditas: ordem, disciplina, regras, rotina, hierarquia, autoridade, controle, sistema, poder, padrão, meta, alvo, pontaria...

opa, peraí. Já estamos entrando num outro campo: o dos guerrilheiros em busca do mesmo poder que criticavam: vamos listar algumas palavras que faziam parte de duas classes: dos milicos e dos revolucionários armados: meta, alvo, estratégia, luta, disciplina, inimigo, tática, regras, poder, força, armas, morte, sangue, controle, destruição, implacável, tortura, uso de força, combate, militar e manutenção do poder.

Agora, já que estamos nessa... vamos listar algumas palavras importantes da "elite cultural" representada pela intelectualidade e artistas, livres leves e soltos (ou quase...): amor, liberdade, leveza, arte, cultura, conhecimento, intelecto, informação, arma oculta, indireta, horizonte, céu, livros, mallarmaico, cores, sons, texturas, cheiros e perfumes, dança, expressão... aaa tá, a lista é infinita. E bem mais agradável que a dos milicos de esquerda e de direita, os primeiros que só liam um livro e os segundos que não liam nenhum.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

4-O emo-cional


Pois bem.

Ontem fui trocar um tênis e fiquei ali passando mal lembrando de toooodo o desenrolar dos tenis desde o kichute e bamba, passando pelos revolucionários nikes air, os new balance, asics, rainha (para volei, coisa da minha geração...) botinhas de camurça e solado de latex (coisa de quem achava que era surfista...) e quando vi estava ali, cogitando retomar alguns anos perdidos de nova adolescência, observando um tenis quase de emo, não quadriculado - jamais - mas colorido o suficiente pra eu me sentir muito, muito deslocado. Seria só pra ir na academia. Mas deu vergonha... tá, sou meio velho, uso tenis preto, coturno, bota de couro, prefiro uma de cowboy a uma de emo. Mas enfim...

Essa busca pela jovialidade que permeia a todos, ou quase todos, ficou ali me rondando. Eu poderia ter pego um desses, meio verde com detalhes em verde limão e faixas brancas e laranja... essas coisas...

A chave desse negócio todo é a transferencia da sensação, da inserção no universo do Outro. Psicanálise atormentada...


É impossível, definitivamente, sentir o que o teen de hoje sente. Nem quero, tenho certeza que sinto coisas mais interessantes desde o Karate-kid original até o cyberpunk de Blade Runner e Matrix. Deve ser por isso que eu adoro usar coturno todo destruído. Combatente, urbano, guerreiro e caçador. Essa coisa que começou a entrar com a história de Esparta no colegial, com os filmes de ninjas, os filmes do Van Damme, comandos em ação, essa coiserada toda da minha época, tão militar... que de japones, tem muito. Predisposição a aceitar o que é bom de cada grupo. E tome livro também, certo?


Sobre os emos de hoje, essa geração que muitos de nós (ex-punks por fora, eternos punks por dentro) desprezam completamente por ser uma geração fraca, mole, frágil, emocionalmente despreparada, mimada e perturbada sexualmente. Não, não estou falando mal de gays, nada contra, nem entro no mérito da questão. Só estou achando, daqui do meu quadradinho, que essa geração é fraquíssima.


Essa coisa de emo é uma fusão de certas coisas... meio que sem distinção ou fronteiras claras:

-Ideologia vazia por esgotamento das anteriores
- Homosexualismo como última forma de contestação de algo que é indistinguível, intangível, invisível, imanipulável.

É uma coisinha de marketing, uma coisinha como dizem, eclética. É como aquela moda de roupas femininas com tecidos retalhados - perfeito para a indústria desovar sobras menores de materia prima a custo de matrial nobre. É como sabonete cheio de picadinhos, é como salgadinhos mesclados - tudo sobra da indústria. Mas no caso da cultura, uma vez que não há muito o que se criar que possa ser absorvido por qualquer idiota, cria-se a cultura quase hermafrodita emo, passiva, colorida, infantil e sem definição sexual, frágil (filhos de pais criados na primeira onda de liberalismo e traumatizados pela frustração tando da ditadura quando da cultura livre).

O inimigo agora não existe: ele se infiltrou, transou com os seus, forjou descendentes e é parte da família. Nesse cenário cultural pós capitalismo industrial, pós inicio do capitalismo financeiro, o liberalismo busca através do esvaziamento conceitual, da dissolução das fronteiras e de todas as formas de definição consistente, enfraquecer os pontos inteligíveis que poderiam ser a origem de uma barreira, de uma resistencia cultural. Todos ficaram perplexos com a neutralização das ideologias anteriores. Todos ficaram com vergonha porque elas eram apenas mais uma onda, e não uma tendencia. E calados, aceitam tudo agora e cada um quer ganhar o seu, ou não largar o osso antigo.


O problema fomentado pelas leis educacionais onde o aluno não pode ser repreendido, nem reprovar de ano, e outros absurdos, foi o selo sobre uma manipulação visível, mas consentida, por interesse de todos os preguiçosos e indisciplinados, fracos de caráter (sim, é tudo questão de caráter conceder ou não esses direitos) que permitiram essa construção social tão infame. O interessante é que isso embora seja ridículo, fraco e venenoso, deverá em breve criar uma geração anti-emo, de teens atrozes, violentos, insensíveis, combatentes e extremamente heterosexuais, com ideologias muito definidas, fortes (seja lá quais forem elas) e penetrantes, incisivas, irônicas, sarcásticas. Serão provavelmente, ácidos e provocadores. Aguentarão porrada, será a geração cyberpunk renascida, na época propícia, e a onda de design clean, light, ecológico, será rapidamente superado pelo design pesado e petrolífero, steam punk, metálico cru.